Observatório da UEL pesquisa os 100 anos da Guerra do Contestado 16/07/2013 - 15:40

O Observatório do Centenário da Guerra do Contestado, mantido pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), está mapeando os “espaços sagrados” deixados pelos monges, considerados pelo povo da época “homens santos”, que lideraram a Guerra do Contestado (1912-1916). Estão sendo levantados todos os vestígios sobre os quatro anos da guerra, resultado de disputa territorial e religiosa entre a população cabocla e os representantes do poder estadual e federal, incluindo os Estados do Paraná e de Santa Catarina.

A partir de pesquisa de campo e entrevistas que retomam a passagem dos monges pela região Sul do país, especialmente no século 19, o grupo pretende construir uma espécie de mapa dos “espaços sagrados”. O mais conhecido é o monge São João Maria, também chamado de João Maria de Jesus. “Os monges são uma espécie de santos populares, que pertencem ao povo, mas não foram canonizados pela igreja. Eles foram importantes porque até hoje ajudam a entender o mundo caboclo”, avalia Nilson Fraga, professor do Departamento Geociências (CCE) e coordenador do observatório.

Segundo ele, a proposta do observatório, que pretence ao Laboratório de Geografias Libertárias e Contemporâneas (Geolib), do Departamento de Geociências, também é traçar os caminhos da passagem mais usados pelos monges no território do Paraná. Um deles começa no Norte do Paraná, passa pelas proximidades de Ponta Grossa e vai até Rio Negro, na divisa do Paraná e Santa Catarina, distante cerca de 90 quilômetros de Curitiba.

Hoje, fontes de água santa, cruzeiros e espaços de ex-votos são locais que remetem à figura simples dos monges. São lugares que se transformaram em destinos de peregrinos para benzimentos e promessas. Entre as cidades que abrigam esses destinos estão Faxinal, Marilândia do Sul, São Jerônimo da Serra, Campo Mourão, Rebouças, Pitanga, Rebouças, Lapa, Mallet e Telêmaco Borba. “Buscamos desvendar os caminhos do monge ou profeta dos caboclos do contestado, São João Maria, por cidades do Norte, Centro-Oeste e Sul do Paraná”, completa.

Em Londrina e região, conforme explica o professor Nilson Cesar, é impossível encontrar espaços sagrados de monges. Para ele, os vestígios da época se perderam ao longo dos anos, conforme o processo de ocupação da cidade avançou. “Há pesquisadores que estudam o Contestado a partir de uma guerra chamada de messiânica, isto é, que envolve o fanatismo religioso daquele povo caboclo. E nós estudamos o viés territorial, que diz respeito ao espaço sagrado dos monges”, explica o professor.

Fins Didáticos - Nilson Fraga, que estuda a Guerra do Contestado desde 1995, afirma que a ideia é pesquisar a Guerra do Contestado a partir de princípios didáticos. O Observatório do Centenário da Guerra do Contestado já acumula resultados desde sua criação, no ano passado. Já foram realizadas 25 palestras e conferências no Paraná e Santa Catarina. Além do livro, lançado recentemente pela Editora Insular, “Contestado em Guerra – 100 anos de massacre insepulto do Brasil” (550 páginas), também já foi produzido o livro “Vale da Morte: o Contestado visto e sentido – Entre a crua de Santa Catarina e a espada do Paraná” (Editora Hemisfério Sul), além de artigos científicos e simpósios sobre o tema.

Alunos dos cursos de graduação e pós-graduação da área de Geografia, do Centro de Ciências Exatas (CCE), também são parceiros da pesquisa alunos da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

O professor Nilson também participou do longa-metragem “O Contestado – restos mortais”, com direção de Silvio Back, que inclusive dirigiu o primeiro filme sobre o tema em 1971. O longa-metragem deverá ser lançado em Londrina no segundo semestre deste ano. Nilson explica que a guerra começou em 1912 e terminou oficialmente em 1916, com o acordo de limite pelas terras entre Paraná e Santa Catarina. “A guerra termina extra-oficialmente em 1917 com a limpeza da terra para a re-colonização, já que o território pertencia há mais de 200 anos à população cabocla”, observa.

“Havia toda uma população cabocla que vivia secularmente aqui e depois deu espaço para as colonizações oficiais. Houve na verdade um grande massacre que resultou na eliminação da população quilombola e negra”, critica. O professor reforça que ocorreu um processo de “branquiamento” do Sul do Brasil a partir da eliminação da população que vivia na região há mais de 200 anos. Os caboclos, segundo o pesquisador, deram espaço para os colonos que vieram da Europa, sobretudo da Alemanha, Itália, Polônia e Ucrânia.

“Todo esse esforço tem por objetivo demonstrar que o Contestado foi muito maior do que se supunha territorialmente, pois há reflexos da sua complexidade social e cultural por todo o Paraná e Santa Catarina, ainda passível de muitos desvendares e desenrolares analíticos futuros”, conclui.

Serviço
Livro: “Contestado em Guerra: 100 anos do massacre insepulto do Brasil”, Nilson Cesar Fraga (organizador), 550 páginas Florianópolis: Editora Insular, 2012, disponível na Secretaria do Departamento de Geociências, no CCE, ao preço de R$ 60, ou nas Livrarias Curitiba, no valor de R$ 79.